O início do livro de Neemias (Ne 1:1–4) nos revela a fragilidade e as limitações naturais do ser humano. Jerusalém estava sob domínio do Império Persa e muitos foram levados à capital do império, mas uma parcela da população permaneceu na colônia (Israel). Alguns destes, ao visitarem Neemias, que estava na capital, relataram-lhe a situação calamitosa da Cidade Santa, em que só havia miséria e destruição.
Essa notícia para um judeu representava a mais pura desgraça. A cidade de Deus estava destruída, o símbolo maior da fé de todo um povo estava em ruínas! Podemos imaginar qual seria essa dor se compararmos ao que sentiríamos caso chegássemos no domingo de manhã à nossa igreja e a encontrássemos destruída. Mas, para Neemias e todos os judeus, muito mais do que a destruição física de Jerusalém, tal situação representava um abalo na fé e na confiança em Deus. A dor que Neemias sentiu ao receber a triste notícia do estado em que se encontrava Jerusalém o fez sentar-se e chorar por alguns dias.
Podemos classificar a reação de Neemias como normal. Ele estava triste e exteriorizou seu sentimento por meio do lamento e do choro. No entanto, por incrível que pareça, para muitos dentro das igrejas tal atitude – chorar e lamentar – é sinal de fraqueza espiritual. E os mais “espirituais” logo poderiam dizer: “É o diabo que está agindo na vida dessa pessoa”.
Há dentro de nossas igrejas uma corrente que acredita que demonstrações de fragilidade ou angústia nada mais são do que expressões claras de falta de fé ou puramente uma ação demoníaca na vida do indivíduo. Tal pensamento, além de equivocado, serve exclusivamente para oprimir ainda mais os atingidos. Afinal, não existe nada mais opressor ou demoníaco do que dizer a alguém que está triste que, se ele exteriorizar esse sentimento, estará sendo fraco espiritualmente.
Neemias chorou porque Deus permite que Seus filhos e filhas, até os mais expressivos como o profeta em questão, fiquem tristes e expressem seus sentimentos das mais diferentes maneiras, inclusive por meio de um choro profundo, que lava a alma e põe a dor para fora. Não podemos nos esquecer de que o próprio Filho de Deus chorou quando recebeu a notícia da morte do Seu amigo Lázaro.
Entretanto, quando olhamos para Neemias percebemos que ele não se entregou ao sofrimento. E esse é o grande segredo para nós cristãos. Podemos chorar e sofrer durante “toda uma noite, mas ao raiar do dia” (Sl 30:5) temos de olhar para o autor e consumador de nossa fé, o Senhor dos Senhores e Rei dos Reis: Jesus. Neemias, depois de chorar e lamentar, passou a jejuar e orar, expondo a Deus sua dor e indignação. Devemos proceder da mesma maneira.
Podemos chorar – e isso em hipótese nenhuma deve ser interpretado como falta de fé –, mas não podemos nunca nos entregar à dor e às decepções, que são inerentes à vida, pois, assim como é certo o nascer do sol no início de um novo dia, assim deve ser nossa confiança em Deus, que nos acolhe com nossas fragilidades, mas também nos renova e nos dá um novo ânimo para continuarmos caminhando com fé e esperança.
Do amigo e pastor,
Tiago Valentin