A noite escura da alma

Lida­mos mal com as esta­ções da vida. Sen­ti­mos difi­cul­da­des em assi­mi­lar as mudan­ças que ocor­rem no decor­rer da exis­tên­cia. No livro dos Cân­ti­cos, o noi­vo cha­ma a ama­da, pois inver­no ter­mi­nou, e afi­gu­ra-se para eles um novo momen­to, mas pare­ce que ela insis­te em con­ti­nu­ar em sua caver­na. Ele, então pro­cu­ra con­ven­cê-la a abrir-se a um novo tem­po que se avi­zi­nha para eles:

Levan­ta-te que­ri­da minha, for­mo­sa minha, e vem;
por­que eis que pas­sou o inver­no, ces­sou a chu­va e se foi;
apa­re­cem as flo­res na ter­ra, che­gou o tem­po de can­ta­rem as aves…”
(Can­ta­res 3.10–13)

O noi­vo cha­ma a ama­da a expe­ren­ci­ar uma nova eta­pa depois de um perío­do difí­cil. A vida é assim, vem em ciclos, como as esta­ções. A soli­dão, a melan­co­lia, e os perío­dos som­bri­os fazem par­te de nos­sa exis­tên­cia. Abor­re­ço-me com pre­ga­do­res que insis­tem em mos­trar a vida do cris­tão como um “eter­no sor­rir”, satis­fa­ção o tem­po todo, ple­ni­tu­de 24 horas, ausên­cia de con­fli­tos. Não temos como evi­tar que coi­sas ruins acon­te­çam, e mui­to menos Deus pro­me­te isso a seus filhos. A dor é ine­vi­tá­vel, e isso nos tor­na mais humanos.

Mui­tos evi­tam envol­ver-se em rela­ci­o­na­men­tos mais pro­fun­dos com medo do sofri­men­to; mas como seres huma­nos, pos­suí­mos den­tro de nós duas neces­si­da­des bási­cas: uma sede por inti­mi­da­de (com o pró­xi­mo) e uma sede por trans­cen­dên­cia (com o divino).

Toda cele­bra­ção é com­par­ti­lha­da cole­ti­va­men­te: ani­ver­sá­ri­os, casa­men­tos, bodas. Mas have­rá tem­po de afas­tar de abra­çar, e estar sozi­nho. Faz par­te da vida. Quem não sabe ficar sozi­nho, e cres­cer nes­se perío­do, aca­ba sem­pre bus­can­do com­pul­si­va­men­te alguém – qual­quer um – des­de que lhe faça com­pa­nhia; e quan­do isso acon­te­ce, depen­dên­cia emo­ci­o­nal rece­be o nome de… amor.

A espi­ri­tu­a­li­da­de sau­dá­vel sem­pre have­rá de pas­sar pelo silên­cio, pela soli­tu­de, pelo valor das coi­sas inte­ri­o­res. A pau­sa na músi­ca, que é o inter­va­lo entre uma nota e outra, é músi­ca tam­bém, faz par­te dela. A bele­za da melo­dia está em res­pei­tar as pau­sas, e não em tocar todas as notas seguidamente.

Deus tam­bém está escre­ven­do pau­sas em nos­sa vida. Não gos­ta­mos delas, mas Jesus insis­te que a tenha­mos. Às vezes ele nos reti­ra do meio da luta por­que a músi­ca que Ele está com­pon­do em nos­sa vida requer um perío­do no “lim­bo”. Não há ple­ni­tu­de de vida que não pas­se pri­mei­ro pela inci­pi­ên­cia e mediocridade.

Nos ciclos da vida have­rá tem­po de mor­rer; quer coi­sa melhor que expe­ri­men­tar a mor­te naqui­lo que não tem mais sen­ti­do em man­ter vivo? Dei­xa Láza­ro mor­rer e des­li­gue os apa­re­lhos que o man­tém vivo na UTI. Somen­te assim Jesus pode che­gar e ressuscitar.

Não impor­ta que esta­ção você expe­ri­men­ta hoje. Ape­nas sai­ba que a vida é assim, e é jus­ta­men­te nes­sa alter­nân­cia de perío­dos bons com perío­dos maus, e é na alter­nân­cia de perío­dos soli­tá­ri­os com tem­pos de cele­bra­ção que a obra de Deus vai sen­do rea­li­za­da em nós. Ape­nas sai­ba ler os acon­te­ci­men­tos, e con­fie Naque­le que está fazen­do uma obra em sua vida.

Pr. Daniel Rocha

Pr. Dani­el Rocha

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