Chega de mimimi!

Pau­lo e Bar­na­bé em Lis­tra” (deta­lhe), por Johann Heiss (1678)

Recen­te­men­te, a cul­tu­ra popu­lar cunhou a expres­são “mimi­mi”, usa­da para imi­tar pejo­ra­ti­va­men­te uma pes­soa que recla­ma por sen­tir-se melin­dra­da. Assim, quan­do alguém res­mun­ga con­tra­ri­a­do por moti­vos que enten­de­mos como fúteis, dize­mos que está fazen­do mimimi.

O melin­dre cor­rom­pe, cau­sa dis­sen­são e enga­no. Cos­tu­ma-se dizer que todo mun­do é um pou­co melin­dro­so. Afi­nal, todos nós nos sen­ti­mos con­tra­ri­a­dos pelos mais dife­ren­tes moti­vos, e isso faz par­te da natu­re­za huma­na. O que nos pre­o­cu­pa é quan­do a pes­soa trans­for­ma essa sus­ce­ti­bi­li­da­de em hábi­to, ou seja, está o tem­po todo se melin­dran­do, por qual­quer moti­vo que seja.

Uma pas­sa­gem bíbli­ca que com­pro­va e ilus­tra bem o peri­go do melin­dre está em Atos 15:36–40. Nes­se tre­cho, Pau­lo e Bar­na­bé se sepa­ram, ao que pare­ce por um moti­vo banal: Pau­lo se sen­tiu con­tra­ri­a­do por­que Bar­na­bé que­ria levar João Mar­cos na segun­da via­gem mis­si­o­ná­ria, e Pau­lo não con­cor­da­va. O moti­vo do emba­te apa­ren­te­men­te não era tão sig­ni­fi­ca­ti­vo para gerar tama­nha dis­cor­dân­cia, mas uma coi­sa é cer­ta: a rea­ção a ele foi ima­tu­ra e des­pro­por­ci­o­nal, espe­ci­al­men­te por se tra­tar de dois mis­si­o­ná­ri­os reco­nhe­ci­dos e res­pei­ta­dos pela Igre­ja. Puro melindre!

Pois bem, o melin­dre sem­pre cau­sa pro­ble­mas, espe­ci­al­men­te para quem tem de admi­nis­trá-los. Em geral, nós pas­to­res e a lide­ran­ça da igre­ja gas­ta­mos mui­to tem­po bus­can­do solu­ci­o­nar ques­tões crí­ti­cas sur­gi­das por melin­dres. Os moti­vos são os mais vari­a­dos e fúteis pos­sí­veis. No entan­to, mais do que as razões dos melin­dres, o que nos espan­ta é quem se quei­xa deles, pois, inva­ri­a­vel­men­te, é gen­te como Pau­lo e Bar­na­bé, com um lon­go tem­po de igre­ja e posi­ção de des­ta­que na comu­ni­da­de. São pes­so­as das quais sem­pre espe­ra­mos um com­por­ta­men­to aci­ma da média, mar­ca­do pela matu­ri­da­de e pela sobri­e­da­de. Mas, infe­liz­men­te, mui­tas vezes não é o que cos­tu­ma acontecer.

A pes­soa melin­dro­sa é tam­bém inse­gu­ra, ima­tu­ra e egoís­ta, pre­ci­sa sen­tir-se valo­ri­za­da o tem­po todo, ape­ga-se a fatos e situ­a­ções míni­mas e irre­le­van­tes e enxer­ga as coi­sas sob uma úni­ca pers­pec­ti­va: a dela. O melin­dre, se não for con­tro­la­do, pode con­du­zir a pes­soa ao peca­do, pois quem se sen­te injus­ti­ça­do e é melin­dro­so ten­de a pro­cu­rar “fazer jus­ti­ça”. Como inte­ri­or­men­te a pes­soa sabe que não está cor­re­ta, a úni­ca for­ma que ela encon­tra de “fazer jus­ti­ça” tam­bém é incor­re­ta – fazen­do fofo­ca, pre­jul­gan­do outras pes­so­as e suas ati­tu­des e geran­do dis­cór­dia e divi­são no seio da igreja.

O ápi­ce do melin­dre de uma pes­soa é quan­do ela deci­de sair da igre­ja. Pri­mei­ra­men­te, é pre­ci­so dei­xar cla­ro que o úni­co inte­res­sa­do em nos ver fora da igre­ja é o Dia­bo. Ele pode até usar situ­a­ções ou outras pes­so­as para pro­vo­car a saí­da de alguém, mas, em últi­ma aná­li­se, é ele quem nos tira da igre­ja. Por­tan­to, quan­do alguém resol­ve se afas­tar ou sair da igre­ja, pode, infe­liz­men­te, estar fazen­do a von­ta­de do Dia­bo. Em segun­do lugar, quan­do alguém se afas­ta ou sai da igre­ja, esse não é o pro­ble­ma em si, mas um sin­to­ma de algo mais sério e pro­fun­do. Ou seja, o afas­ta­men­to ou saí­da da igre­ja deno­ta que algo mais pre­o­cu­pan­te está acon­te­cen­do com a pes­soa. E são essas ques­tões mais pro­fun­das que pre­ci­sam ser tratadas.

Mais tar­de, Pau­lo, já mais madu­ro, recon­si­de­rou sua posi­ção, reco­men­dan­do João Mar­cos para ser um auxi­li­a­dor de Timó­teo em Éfe­so (2 Tm 4:11).

Que, assim como Pau­lo, pos­sa­mos cami­nhar rumo ao ama­du­re­ci­men­to das nos­sas emo­ções e espe­ci­al­men­te da nos­sa fé, pois todos nós, sem nenhu­ma exce­ção, pode­mos e deve­mos cres­cer. Que Deus nos cure e nos livre de todo mimi­mi, para que seja­mos uma igre­ja cada vez mais sau­dá­vel e madura.

Do ami­go e pastor,

Pr Tiago Valentim

Tia­go Valentin

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