“Fiquem quietos! Saibam, de uma vez por todas, que Eu sou Deus” (Salmo 46.10)
Profusão de palavras, profusão de profecias, profusão de decretos… Há uma verborragia [Dic.: uso de uma quantidade excessiva de palavras e de enorme fluência, para dizer coisas de pouco conteúdo ou importância] no ar. Pregadores gritam frases desconexas nas rádios, numa mistura de português, “angeliquês” e pedidos de oferta. Na TV, pastores de cabelos engomados falam aos borbotões ensinando fórmulas de como conquistar amor, dinheiro e felicidade. Músicas cristãs, com forte apelo comercial, pobres em letras, rimas e conteúdo, invadem todas as freqüências do dial. Nunca houve tanta banalização da palavra. É inútil tentar separar o que é Evangelho do que é proselitismo barato.
Eu creio que o Diabo está enchendo o mundo de ruídos para abafar a voz de Deus que insistentemente quer falar ao coração. São legiões gritando o tempo todo. Ninguém mais ouve a voz que vem do fundo da alma.
Ah, se de repente se calassem as bandas, as rádios, os CDs, as TVs, os pregadores… A conseqüência imediata seria a debandada do povo que busca agitação para suas vidas, e sobraria apenas os que não aceitam ouvir nada menos que Deus.
Enchemos a vida de ruídos porque tememos ouvir a voz do coração. Fugimos do contato conosco mesmo, e perdemos o centro da vida e do equilíbrio. Não estamos centrados em nós mesmos. Daí a angústia, aquele sentimento vago de quem não sabe exatamente porque está triste. É a dor que não tem objeto, posto que lhe é desconhecida.
Confesso que, desde criança, achava convidativo ver igrejas com as portas abertas o dia inteiro, e no meio da agitação e burburinho da cidade, pessoas entravam mansamente e ajoelhavam-se no genuflexório, na penumbra de um santuário vazio. Sozinhas, em silêncio, faziam suas orações, e suspendiam por um momento suas vidas cansadas. Hoje isso seria impossível. Por quê? Logo viria uma pessoa falando e discorrendo do que sabe e do que não sabe. Somos o povo do blá-blá-blá. O silêncio é visto como um tempo inútil e constrangedor em que não se faz “nada”. Por isso deve ser eliminado.
Aquieta-te Marta! Por que tanta agitação, tanto corre-corre? Sente-se, escute o Mestre, aquiete o seu coração ansioso. Eu quero falar-lhe, mas você não deixa. Passa longos momentos orando… pedindo… mas quando vou lhe falar ao coração, não da oportunidade. Fique quieta, faça um silêncio interior. Como o velho Salomão ensinou: “Não te precipites com a tua boca, nem o teu coração se apresse a pronunciar palavra alguma diante de Deus… portanto, sejam poucas as tuas palavras” (Ec 5.2). Não te achegues diante do Rei e vai pedindo: “eu quero isso, resolve aquilo, me dá aquilo outro”. Reverencie o Rei, proste-se aos Seus pés, adore‑O, sinta a Sua presença…
“A sanguessuga tem duas filhas, dá, dá” (Pv 30.15). Por que “dá, dá”? Porque não se satisfazem, nada sacia. Mesmo que o Senhor lhe conceda a provisão necessária, ainda assim acha que lhe falta algo. Na verdade, não é falta de algum bem específico, mas é a falta de Deus: o tamanho da vacuidade é do tamanho de Deus. Há uma insatisfação geral, há uma alma insaciável. A sanguessuga sempre quer mais porque nada lhe apetece, nada lhe apraz.
Agostinho disse que O homem é a única criatura que pode vir a conhecer Deus, mas para fazê-lo ele precisa, previamente, entrar em contato consigo mesmo. É só a partir desse encontro consigo que se desfraldará o encontro com Deus. E para estar em contato consigo faz-se necessário o silêncio interior.
Fico imaginando Jesus, em silenciosas madrugadas, subindo ao monte para orar ao Pai. E ali, sem nenhuma palavra nos lábios, longe do burburinho, e com o coração vazio e sedento, começa uma longa conversa silenciosa com o Pai. Que coisa maravilhosa aprender que “mesmo no silêncio e com o silêncio dialogamos”.
Um Amém silencioso para você!
Pr. Daniel Rocha