No olho do furacão

O Senhor tem o seu cami­nho na tor­men­ta e na tem­pes­ta­de” (Naum 1.3)

Heca­tom­bes, desas­tres, revo­lu­ções, per­se­gui­ções, pan­de­mi­as, dívi­das, doen­ças diag­nos­ti­ca­das, famí­li­as deses­tru­tu­ra­das… como viver a fé em meio ao caos? Como estar em paz quan­do nos encon­tra­mos no olho do fura­cão? Essas coi­sas deses­ta­bi­li­zam, saco­dem, dese­qui­li­bram, tiram o chão.

Bas­ta um peque­no aneu­ris­ma no cére­bro, bas­ta o sur­gi­men­to de um nódu­lo no seio, para que de repen­te seja­mos joga­dos no olho do furacão.

Faz par­te do ser huma­no bus­car a segu­ran­ça e a pre­vi­si­bi­li­da­de, e é dese­já­vel bus­car uma vida sem sobres­sal­tos e livre de más notí­ci­as. Mas creio que pode haver um ele­men­to de trans­for­ma­ção do ser que somen­te é des­per­ta­do em meio às bor­ras­cas. Uma mudan­ça de tra­je­tó­ria e de pos­tu­ra pode sur­gir em meio ao tur­bi­lhão. Quem pode afir­mar que ali não se ini­ci­a­rá uma cami­nha­da de vol­ta ao Pai? O Senhor tem o seu cami­nho na tor­men­ta e na tem­pes­ta­de (Naum 1.3)!

Estar no olho do fura­cão nos faz repen­sar a vida. Há um apren­di­za­do em cur­so. Quem já pas­sou por um diag­nós­ti­co “irre­ver­sí­vel” num hos­pi­tal, apren­de­rá agra­de­cer a Deus fer­vo­ro­sa­men­te a cada manhã vivi­da. Quem um dia per­deu tudo, foi humi­lha­do, e sen­tiu-se sozi­nho, sabe­rá valo­ri­zar a ami­za­de, o com­pa­nhei­ris­mo e a soli­da­ri­e­da­de. Aque­le que um dia pas­sou neces­si­da­de reco­nhe­ce­rá o valor que há em comer um sim­ples peda­ço de pão.

Há algo de para­do­xal nos acon­te­ci­men­tos da vida. Davi admi­tiu que lhe foi bom “ter pas­sa­do pela afli­ção” (Sl 119.71), ou em outras pala­vras, ter esta­do no “olho do fura­cão”, para que ele com­pre­en­des­se coi­sas que antes não com­pre­en­dia. A cons­ci­ên­cia da imi­nên­cia da mor­te faz o homem relem­brar a sua fini­tu­de e tem­po­ra­li­da­de. A soli­dão, o medo, o vazio, pos­su­em o ben­di­to valor tera­pêu­ti­co de res­ga­tar sen­ti­men­tos que até então encon­tra­vam-se ador­me­ci­dos den­tro da alma.

É um rela­to como­ven­te quan­do Davi se refu­gia numa caver­na, a caver­na de Adu­lão, fugin­do de Saul, que dese­ja­va matá-lo. Seus irmãos e toda a casa de seu pai foram para a caver­na estar com ele. E o mais sur­pre­en­den­te: ajun­ta­ram-se a Davi todos os homens que “se acha­vam em aper­to, endi­vi­da­dos, e todos os amar­gu­ra­dos de espí­ri­to”, e Davi se fez che­fe deles (1Sm 22.1–2). Quem está no olho do fura­cão des­co­bre ines­pe­ra­dos com­pa­nhei­ros de caminhada.

Des­de­nho a “fé” dos falas­trões da TV, mas me como­vo com a fé daque­las mães que levam seus filhos todos os dias para tra­ta­men­to na AACD. Não me como­vo com os tes­te­mu­nhos de “pros­pe­ri­da­de” repen­ti­na, mas me emo­ci­o­no ven­do filhos cui­dan­do de seus velhos com o mal de Alzhei­mer. Acho que ago­ra com­pre­en­do quan­do o Pre­ga­dor diz que “melhor é ir à casa onde há luto do que ir à casa onde há ban­que­te, pois naque­la se vê o fim de todos os homens” (Ecl 7.2). Sim, pre­ci­sa­mos conhe­cer o fim para ree­du­car nos­sa manei­ra de viver.

Hoje não nos reu­ni­mos mais em uma caver­na em tor­no de um homem, mas em tor­no Daque­le que com­pre­en­de o que é sofrer. Jesus, o Filho de Davi está pre­pa­ra­do para rece­ber as almas angus­ti­a­das que se uni­rão à Sua vol­ta, obe­de­cen­do à sua von­ta­de. Ele rece­be a todos, por mais mise­rá­veis que sejam.

Nos­sas reu­niões de cul­to são para todos. Entre­tan­to, os feli­zes, os sãos, e os que bas­tam a si mes­mos ima­gi­nam que não pre­ci­sam de Deus… mas assim como na caver­na de Adu­lão, reu­ni­mo-nos com os can­sa­dos, opri­mi­dos e aque­les que tem algo difí­cil de supor­tar, e vem até a Cruz para cho­rar, pedir, supli­car. Venha se unir em tor­no de Cristo.

Pr. Daniel Rocha

Pr. Dani­el Rocha

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