Existem algumas teorias e modelos que definem o que é uma espiritualidade saudável, ou seja, que faça bem para as pessoas e para a comunidade. Para nós metodistas, espiritualidade saudável tem tudo a ver com uma vivência espiritual equilibrada. Portanto, uma espiritualidade doente, ou doentia, é aquela que se expressa no isolamento dos extremos. Uma frase atribuída a Martinho Lutero expressa bem essa ideia. Segundo o reformador, “o Diabo mora nos extremos”. Dentre tantos atributos da teologia wesleyana, o que mais me impressiona é a busca pelo equilíbrio.
Segundo Jesus, toda a Lei e os Profetas, isto é, toda a Escritura Sagrada, pode ser resumida por estas palavras: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. O segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas” (Mt 22:37–40). Amar a Deus e amar ao próximo são os dois lados inseparáveis da face única do viver cristão. John Wesley, fundador do movimento metodista, interpretou esse mandamento de Jesus dizendo que a pessoa cristã é conhecida por seus atos de amor, que se manifestam de duas formas: em atos de piedade e em atos de misericórdia.
Atos de piedade são aqueles praticados para o louvor a Deus, o enriquecimento da fé e o crescimento no conhecimento das Escrituras, e visam aumentar a comunhão com Deus. São, portanto, a expressão transcendente da nossa fé. Já os atos de misericórdia são aqueles praticados em favor do próximo para auxiliá-lo em suas necessidades materiais, psicológicas e espirituais. Isto é, a dimensão imanente da nossa fé.
Ainda dentro da lógica wesleyana, nós metodistas também devemos ser conhecidos pelo “pensar e deixar pensar”, ou seja, há uma margem de liberdade na maneira de expressar nosso pensamento e, consequentemente, nossa fé. Não há um padrão, uma regra, um único modelo a ser seguido; desde que expressemos o amor a Deus e ao próximo, estaremos cumprindo o mandado de Jesus. Por isso, John Wesley também usou por diversas vezes a frase de Santo Agostinho: “No essencial, unidade; no não essencial, liberdade; em tudo, amor”.
Creio que muitas vezes, ao longo da história da Igreja Cristã – e para nós metodistas não é diferente –, o transcendente sempre gerou mais discussões do que o imanente. Por razões óbvias, a expressão transcendente da nossa fé gerou e continua a gerar tensões dentro da Igreja exatamente porque é transcendente.
Falando mais uma vez da vivência espiritual metodista, um dos fundamentos da nossa doutrina é a “experiência pessoal com Cristo”, ou seja, todo cristão e toda cristã precisa necessariamente passar por uma “experiência” que seja pessoal, ou particular, na qual ele e ela sentem, compreendem e admitem a graça e o amor de Deus por suas vidas. E a doutrina metodista vai além quando defende que nossa vivência cristã não pode ser definida por uma única experiência, mas por diversas, ao longo da nossa vida, que nos conduzam a uma caminhada de santidade.
Na próxima pastoral continuaremos com esta reflexão, mas já deixo aqui uma provocação: “Há um padrão ou um limite para a expressão transcendente da nossa fé?”.
Do amigo e pastor,
Tiago Valentin