“Flexibilizar” é certamente o verbo mais polêmico e um dos mais utilizados neste quase um ano e meio de pandemia. Dentre tantos conceitos e termos comuns ao contexto da pandemia, um dos que passamos a usar com maior frequência é a expressão “flexibilização”. Isso porque uma das imposições da pandemia são as restrições indicadas pelos sanitaristas visando conter o contágio do vírus. E aprendemos a dizer que, quando o relaxamento dessas restrições acontece, está se fazendo uma flexibilização.
Quantos se lembram de que, logo nos primeiros meses das restrições no Estado de São Paulo, foi definida uma data para o fim da quarentena e, consequentemente, a flexibilização das restrições? Contudo, no segundo adiamento, o governo estadual decidiu não mais estabelecer uma data para o fim da quarentena e, àquela altura, a flexibilização estava fora de cogitação. Mas, além da flexibilização no que diz respeito à mobilidade e aglomerações, há também uma flexibilização interior, que tem a ver com nossas prioridades e paradigmas de vida e tem nos desafiado neste tempo.
Muitos foram os ajustes e adaptações necessários para continuarmos vivendo com segurança durante a pandemia. Os modos de estudar, de trabalhar, de se divertir e de congregar tiveram que mudar. Entretanto, essas mudanças externas impostas pela pandemia não necessariamente acompanharam as mudanças que tiveram de acontecer dentro de nós. Lembremos o quanto foi abrupta a definição das restrições, ainda que elas sejam necessárias. Só para exemplificar, num domingo à noite estávamos cultuando na igreja e, no domingo seguinte, o templo estava fechado e permaneceu assim por quase um ano inteiro.
Mais do que uma mudança de hábitos e rotinas, tivemos de mudar nossa forma de pensar, de nos organizar, de valorar, de corresponder, de viver. Descobrimos que é impossível converter plenamente uma vida presencial em virtual. Nossa estrutura interna grita dentro de nós por uma vida presencial, mas a resposta externa é de que isso não é possível. Eis o conflito estabelecido, eis a chance e, para muitos, a realidade de uma crise.
A conclusão mais sábia e salutar é a seguinte: precisamos flexibilizar conosco mesmos e com o outro. Precisamos entender que a pandemia nos impõe uma dura realidade: a perda é um fato inevitável. Por isso, precisamos ajustar, ponderar e, literalmente, flexibilizar nossas expectativas, nossas exigências e nossos parâmetros. Precisamos cobrar menos, precisamos exigir menos, precisamos tolerar mais – e isso se aplica a nós e a todos com quem convivemos. Se quisermos manter o mesmo ritmo e o mesmo formato de vida que tínhamos antes da pandemia, iremos inevitavelmente adoecer a nós e aos outros.
Percebo que muitos têm tido essa dificuldade de flexibilizar consigo mesmos e com o outro. Ouvi de uma pessoa, há semanas, o seguinte questionamento: “Mas por que fulano não está dando conta, se é algo tão simples?”. Então eu perguntei à pessoa: “É sério que você não sabe por que fulano não está dando conta?”. E, para minha surpresa, a resposta foi: “Não, não sei”. Com muita paciência, lembrei à pessoa que estamos no meio de uma pandemia e que isso acarreta uma série de dificuldades em todas as áreas das nossas vidas.
Meu querido irmão, minha querida irmã, peço a você, pelo seu bem e pelo bem de quem convive com você: flexibilize!
Do amigo e pastor,
Tiago Valentin