Escândalo (do Gr.: skálon: pedra, obstáculo) é um fato ou acontecimento que contraria e ofende crenças, convenções morais ou religiosas. Os mais antigos se lembrarão da atriz Leila Diniz que chocou a sociedade em 1971 ao aparecer grávida numa praia exibindo a barriga de fora. Tal fato pode soar estranho hoje, mas à época chocou. O que dizer então, do astro do cinema Clark Gable, que em 1933, em uma cena, tirou a camisa e estava sem camiseta por baixo? Escandalizou.
Igreja é um lugar que possui incontáveis histórias de escândalos. Num passado recente, muita gente foi considerada anátema e colocada pra fora do círculo da fé por motivos que hoje seriam considerados banais. É um exército de pessoas que muito dificilmente serão recuperadas para o Reino.
Jesus nunca teve problemas com prostitutas, ladrões, com flagrantes de adultério, nem se escandalizou com festas, comidas, beijo, perfumes… Na verdade, as coisas que o incomodavam sempre estavam ligadas ao desamor.
Ele próprio veio para ser escândalo e pedra de tropeço para muitos. O Mestre escandalizou aos religiosos de sua época ao permitir que seus discípulos comessem sem realizar o ritual de lavar as mãos – que foi motivo de indignação para os judeus. E ainda aproveitou para trazer um importante ensinamento: “não é o que entra pela boca o que contamina o homem, mas o que sai da boca, isto sim, contamina o homem” (Mt 15.11).
Em outra ocasião entabulou uma conversa em público com uma mulher – algo impensável à época – e pior, com uma samaritana. Samaritanos eram mal vistos pelos judeus, que os consideravam impuros, povo de “segunda classe”, e espiritualmente espúrios. Até mesmo os seus discípulos ao verem a cena de Jesus sentado junto ao poço com aquela mulher ficaram chocados. Sim, Jesus causou escândalo porque quebrou preconceitos, quebrou uma tradição de cinco séculos de ódio profundo entre aquela gente.
Noite de Natal de 1914, I Guerra Mundial, soldados alemães de um lado, separados das tropas inglesas e uma terra de ninguém entre eles. Do lado alemão começaram a entoar cânticos natalinos. Os ingleses, ao ouvirem, também cantaram seus hinos. Logo silenciaram as armas e os soldados alemães saíram das valas e caminharam pelo campo escuro. O mesmo fez o inimigo. Apertaram-se as mãos, trocaram presentes, e conversaram por horas durante a fria madrugada, como velhos amigos. Foi um gesto impressionante, que Paul McCartney eternizou com a bela canção “Pipes of Peace”. Dias depois, quando os generais souberam, aquilo foi tratado como um escândalo inadmissível numa guerra. Gestos de amor sempre são chocantes para quem está mergulhado em conflitos.
Aos olhos de Cristo, o maior de todos os escândalos é a falta de amor. Tudo o mais é digno de misericórdia e compreensão, pois onde é “abundante o pecado”, ele entra com o “antídoto” da graça. Acolher ao pecador e tratá-lo com dignidade e amor não significa concordância com o erro, mas uma oportunidade de permitir a manifestação da ação restauradora de Deus sobre a sua vida.
Quem ainda é frágil na fé está sempre se escandalizando. Mesmo assim, Paulo ensina que precisam ser acolhidos; e nos vigiemos para que não sejamos “tropeço ou escândalo” (Rm 14.13) para eles. Tais pessoas são chamadas de “frágil na fé” porque sua consciência ainda não amadurecida se perde nas pequenas coisas: “não toqueis nisso, não manuseies aquilo”. Paulo diz que essas coisas em si “não são nada” (1Co 8.4).
Entretanto, é preciso crescer, amadurecer. O próprio Paulo se sentia “fiscalizado” pelos irmãos recém-convertidos do judaísmo que desejavam cerceá-lo, mas ele confrontou-os brandindo a “liberdade que temos em Cristo Jesus” (Gl 2.4). Devemos sim, nos escandalizar e nos chocar, mas pelos motivos certos…
…com a corrupção dos nossos governantes,
…com o engano dos lobos disfarçados de pastores,
…com o mercantilismo da fé,
…com a perseguição aos cristãos na Índia, Irã e na Coréia do Norte,
…com a dor dos que sofrem por causa da injustiça,
… com a desafeição entre as pessoas,
O que te choca?
Pr. Daniel Rocha