Batiza-nos com angústia!

Pau­lo escre­ve sobre a angús­tia pelo Evangelho

Já faz algum tem­po que tenho sen­ti­do den­tro de mim uma inqui­e­ta­ção e um incô­mo­do que não sen­tia há anos. E por diver­sas vezes per­gun­tei a Deus o que é isso que estou sen­tin­do. Será que estou em peca­do? Será que não tenho rea­li­za­do Sua von­ta­de? Será que não tenho obser­va­do os man­da­men­tos? Será que não tenho sido um bom pai, um bom mari­do ou mes­mo um bom filho? Será que não tenho ama­do o Senhor o sufi­ci­en­te? Será que não O tenho ser­vi­do ple­na­men­te? Eu me fiz diver­sas outras per­gun­tas como estas e, ao fazer uma auto­a­ná­li­se, minhas res­pos­tas até que me pare­ce­ram razo­a­vel­men­te satisfatórias.

Con­tu­do, per­ce­bi que a inqui­e­ta­ção e o incô­mo­do não iam embo­ra, e então mudei as per­gun­tas: será que eu estou oran­do pou­co? Será que não estou jeju­an­do? Devo ampli­ar minha lei­tu­ra bíbli­ca? Então come­cei a refor­çar meu desem­pe­nho nas dis­ci­pli­nas espi­ri­tu­ais, mas, mes­mo ten­tan­do atu­ar espi­ri­tu­al­men­te em alto nível, per­ce­bi que isso tam­bém não resol­via, não muda­va o que me inco­mo­da­va inte­ri­or­men­te; pelo con­trá­rio, só aumen­ta­va aque­la inqui­e­ta­ção e me aba­tia ain­da mais.

Come­cei a achar que o pro­ble­ma era com a minha saú­de e fui pro­cu­rar aju­da pro­fis­si­o­nal. Aca­bei de fato des­co­brin­do alguns dis­túr­bi­os, todos eles em decor­rên­cia do meu seden­ta­ris­mo acu­mu­la­do. Che­guei a pen­sar: o que tenho sen­ti­do deve ser pela bai­xa pro­du­ção de dopa­mi­na e endor­fi­na, carên­cia que se resol­ve com ati­vi­da­de físi­ca. Em qua­tro meses, pas­sei a suple­men­tar meu cor­po com vita­mi­nas e hormô­ni­os, que esta­vam des­re­gu­la­dos, e a pra­ti­car ati­vi­da­de físi­ca, o que me aju­dou e está me aju­dan­do, pois per­di peso e estou ganhan­do qua­li­da­de de vida. No entan­to, isso tam­bém não mudou o que sin­to inte­ri­or­men­te nem redu­ziu a inqui­e­ta­ção que tan­to me perturba.

Então, come­cei a pro­cu­rar nos estu­dos de psi­co­lo­gia e psi­ca­ná­li­se algo que res­pon­des­se aos meus ansei­os ou jus­ti­fi­cas­se o qua­dro inte­ri­or pelo qual estou pas­san­do e che­guei a me ques­ti­o­nar se não seria algo para ser tra­ta­do pela psi­qui­a­tria, tal como a ansi­e­da­de e a depres­são, os males des­te sécu­lo. Con­cluí, porém, que a ansi­e­da­de é o exces­so de futu­ro, e a depres­são, o exces­so de pas­sa­do, assim como o estres­se é o exces­so de pre­sen­te. Pen­sei até em bur­nout – ou sín­dro­me do esgo­ta­men­to pro­fis­si­o­nal, algo que já tive e tra­tei quan­do pas­to­re­a­va a igre­ja ante­ri­or –, mas esta é uma inqui­e­ta­ção diferente.

Depois de meses sen­tin­do essa inqui­e­ta­ção, pude per­ce­ber em Deus que ela era uma espé­cie de angús­tia. Mas o que é angús­tia? O dici­o­ná­rio Oxford a defi­ne como “estrei­te­za, redu­ção de espa­ço ou de tem­po; carên­cia, fal­ta; esta­do de inqui­e­tu­de; sofri­men­to, tor­men­to”. Eu esta­va angus­ti­a­do e não sabia. Esta­va não, estou! Não pela ausên­cia de Deus em minha vida, não pela fal­ta de prá­ti­ca da reli­gi­o­si­da­de, não pela vida que levo, não pela famí­lia que tenho, não por­que me fal­te algo.

Angús­tia é uma pala­vra que per­pas­sa as Sagra­das Escri­tu­ras, do Anti­go ao Novo Tes­ta­men­to. Em hebrai­co, usa-se a pala­vra tsar, ou tsa­rah, tra­du­zi­da tam­bém por “afli­ção” (Jó 5:19 e 15:24; Sl 81:7); no gre­go, lín­gua do Novo Tes­ta­men­to, as pala­vras são ade­mo­neo, suno­di­no e ste­no­cho­ria (Mc 14:33; Rm 8:22; 2 Co 6:4), que tam­bém sig­ni­fi­cam “afli­ção”, “pro­fun­da dor” (como a de par­to), “extre­ma afli­ção” ou “cala­mi­da­de”. A angús­tia, bibli­ca­men­te, não ocor­re ape­nas quan­do pas­sa­mos por algo ruim e não é, de modo algum, obra do dia­bo. Às vezes, Deus nos per­mi­te pas­sar por angús­ti­as e até ser con­su­mi­dos por elas para per­ce­ber­mos algo que comu­men­te não per­ce­be­ría­mos: “Que pen­sais vós con­tra o Senhor? Ele mes­mo vos con­su­mi­rá de todo; não se levan­ta­rá por duas vezes a angús­tia.” (Na 1:9); assim como é Ele tam­bém que nos livra da angús­tia: “Senhor, tem mise­ri­cór­dia de nós; em ti temos espe­ra­do; sê tu o nos­so bra­ço manhã após manhã e a nos­sa sal­va­ção no tem­po da angús­tia” (Is 33:2).

Eu creio que o pró­prio Deus envi­ou a angús­tia a esta gera­ção: “Por­que sabe­mos que toda a cri­a­ção, a um só tem­po, geme e supor­ta angús­ti­as até ago­ra”. (Rm 8:22). Tam­bém creio que Ele está bati­zan­do a igre­ja com um batis­mo de angús­tia por ela não fazer a dife­ren­ça que pre­ci­sa fazer nes­ta gera­ção e por con­for­mar-se ape­nas em ser uma igre­ja em si mes­ma, e não uma igre­ja que muda o mun­do. A igre­ja não pode ser um pas­sa­tem­po, nem um entre­te­ni­men­to, nem um clu­be de recal­que. Ela pre­ci­sa ser a agên­cia de sal­va­ção do mun­do, um lugar onde as pes­so­as sejam ali­vi­a­das de sua angús­tia huma­na e bati­za­das com a angús­tia divi­na. Não é somen­te uma tro­ca de far­do e de vida, mas tam­bém uma tro­ca de angústia.

Tal­vez você me ache um lou­co por fazer tais afir­ma­ções, mas é nelas que eu me tran­qui­li­zo! Afir­ma­mos ser imi­ta­do­res de Jesus, mas o que tem nos fei­to suar san­gue de angús­tia como Jesus suou? No Get­sê­ma­ni, de acor­do com as Escri­tu­ras, Jesus ficou pro­fun­da­men­te angus­ti­a­do e Seu suor se con­ver­teu em gran­des gotas de san­gue. Segun­do a medi­ci­na, esse even­to é cha­ma­do de hema­ti­dro­se, ou seja, excre­ção de suor com san­gue! Tra­ta-se de um fenô­me­no rarís­si­mo, cau­sa­do por pro­fun­da emo­ção e como­ção (Lc 22:44).

O após­to­lo Pau­lo tam­bém enten­deu que, como minis­tro de Deus, pas­sa­ria por essa angús­tia pelo Evan­ge­lho (2 Co 6:4). Por que nós sería­mos pou­pa­dos dis­so se Deus nem ao Seu pró­prio filho pou­pou (Fp 1:29; Rm 8:32)?

Pen­sei diver­sas coi­sas por me sen­tir assim. Pen­sei até mes­mo que esta­va fican­do lou­co ou per­di­do. Con­tu­do, ao pes­qui­sar sobre o assun­to cons­ta­tei que outros homens de Deus do pas­sa­do já sen­ti­ram o que estou sen­tin­do e tam­bém pre­ga­ram sobre isso em seu tem­po. Foi o caso do pas­tor esta­du­ni­den­se David Wil­ker­son, nas déca­das de 1970 e 1980, como cons­ta­ta­mos em sua famo­sa pre­ga­ção “Um cha­ma­do para angús­tia” (dis­po­ní­vel em: https://youtu.be/kRYhW4wO3UY).

Tal­vez você este­ja pas­san­do pelo mes­mo sen­ti­men­to gera­do por Deus no seu inte­ri­or e, tal como eu, não enten­de o que é. Tal­vez este bre­ve tex­to lhe tra­ga luz para sair dis­so ou, pelo menos, para apren­der a lidar com isso. Por­que toda pai­xão ver­da­dei­ra come­ça com uma angús­tia. Coloque‑a no lugar cer­to e a uti­li­ze corretamente.

Ah, que­ri­do irmão, que­ri­da irmã, o que tem angus­ti­a­do você? As coi­sas des­ta vida ou as do por­vir? Sua pró­pria vida ou a per­di­ção de mui­tos? Você não fica angus­ti­a­do com as coi­sas que estão acon­te­cen­do à sua vol­ta? E você vai ficar para­do? Nes­te exa­to momen­to, não o(a) angus­tia que pes­so­as este­jam indo para o infer­no? Não lhe traz angús­tia o fato de a igre­ja estar mais pre­o­cu­pa­da com a esté­ti­ca do que em ser pro­fé­ti­ca? Não lhe traz uma angús­tia san­ta per­ce­ber que o Bra­sil está cheio de cris­tãos igre­ja­dos e desi­gre­ja­dos, e o país não muda, só pio­ra? Se você tem olha­do só para você, que­ro lhe dizer que você pre­ci­sa urgen­te­men­te de um batis­mo de angús­tia! Sua vida está con­for­tá­vel? Tran­qui­la? Não lhe traz angús­tia saber que o cen­so demo­grá­fi­co bra­si­lei­ro clas­si­fi­ca boa par­te dos cris­tãos atu­al­men­te como evan­gé­li­cos não pra­ti­can­tes? Bati­za-nos, Senhor Deus, não só com amor pelas almas, mas com a angús­tia e com o incon­for­mis­mo com este mundo!

Que o Senhor faça você sen­tir pra­zer na angús­tia! Pra­zer na angús­tia, pas­tor? Sim, sim, na angús­tia! “Pelo que sin­to pra­zer nas fra­que­zas, nas injú­ri­as, nas neces­si­da­des, nas per­se­gui­ções, nas angús­ti­as, por amor de Cris­to. Por­que, quan­do sou fra­co, então, é que sou for­te” (2 Co 12:10).

Pr. Isra­el Rocha

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