Na pastoral do último domingo (16/2), comecei a tratar sobre o que é uma espiritualidade saudável. De modo geral, podemos dizer que uma espiritualidade cristã vivenciada de maneira saudável está ligada a uma prática equilibrada da fé. Aliás, para os metodistas em particular, o equilíbrio é uma marca elementar para a prática cristã. Expus também que esse equilíbrio se dá na vivência do amor a Deus e ao próximo, que se expressam por meio de experiências transcendentes e imanentes.
Finalizei a primeira parte desta pastoral propondo a seguinte reflexão: “Há um padrão ou um limite para a expressão transcendente da nossa fé?”. Quero dizer, qualquer expressão individual ou comunitária no campo místico é válida? Para responder a essa questão precisamos recorrer à Bíblia e à nossa doutrina metodista.
A Bíblia, que é o fundamento e a referência para todas as nossas práticas de fé, nos revela a dimensão e a importância do transcendente na relação entre os seres humanos e o Criador. Eu poderia citar dezenas de textos bíblicos que relatam a manifestação transcendente de Deus. Só a título de exemplo, destaco a sarça ardente, o chamado de Samuel, a destruição de Jericó e a transfiguração de Jesus no monte.
Mas lhe proponho um exercício. Imagine o seguinte cenário numa igreja: todos estão reunidos, orando e clamando para que Deus cumpra Sua promessa, quando, de repente, começam a ouvir um som que vem do teto da igreja, e um vento forte invade o templo, preenchendo todos os espaços. As pessoas reunidas começam a ver fogo sobre as cabeças umas das outras e o Espírito Santo enche a todos, que passam a falar em línguas espirituais. Muitos que estão na igreja começam a se perguntar o que é aquilo que está acontecendo. As pessoas que se encontram fora do templo percebem toda aquela movimentação e a reação de quem está lá dentro, e então começam a desqualificar e a zombar daqueles irmãos e irmãs.
Alguns podem até dizer que esse relato não passa de um momento de emocionalismo, sugestão ou catarse, ou que se trata de mais uma moda gospel que logo vai passar. Contudo, imagino que a maioria, ao ler esse relato, o tenha relacionado à passagem bíblica de Atos 2. Pois é isso mesmo. Trata-se do episódio da descida do Espírito Santo em Jerusalém durante a festa de Pentecostes. Essa experiência mística, transcendente, que ocorreu em Jerusalém foi determinante para que a Igreja passasse a ser uma realidade.
Toda essa experiência mística desembocou em algo muito concreto, após a descida do Espírito Santo. Pedro pregou e 3 mil pessoas se arrependeram e foram batizadas (Atos 2:37–41). A Igreja se estruturou e as pessoas passaram a viver em comunhão, apoiando-se umas às outras espiritualmente e materialmente (Atos 2:42–47). Nada mais metodista, concorda? Pois nós buscamos intensamente a Deus e desejamos ardentemente senti-Lo, ouvi-Lo, experimentá-Lo, com sinceridade e liberdade, pois, uma vez cheios do Seu poder, da Sua graça e do Seu amor, somos enviados para socorrer aqueles que sofrem, que padecem física, emocional ou espiritualmente.
Mas, voltando à pergunta inicial, há um padrão de experiências transcendentes? A resposta é não. As experiências transcendentes não têm um padrão, pois Deus nos chama pelo nome e nós O experimentamos das maneiras mais diversas. Não podemos de modo algum ter uma postura inquisitória delimitando o que é ou o não é de Deus. Não importa se temos uma experiência transcendente na hora de entoar um hino, com as luzes acesas ou apagadas na hora do louvor, durante a música que o coral entoa ou quando estamos ajoelhados nos confessando. As experiências são diversas, pois Deus age na sua multiforme graça. A questão é o que essas experiências geram em nossas vidas e na nossa comunidade. Certa vez, John Wesley foi questionado sobre o que ele faria com alguns irmãos que estavam caindo no chão durante os cultos metodistas. A esse respeito ele respondeu: “Não me importa quantas vezes eles estão caindo, mas sim como eles irão caminhar quando se levantarem”.
Do amigo e pastor,
Tiago Valentin