Algo que tem me chamado a atenção nos últimos meses é a intensificação de uma prática explicitamente reprovada por Jesus nos Evangelhos: julgar o outro. Minha percepção, ultimamente, é de que as pessoas, de uma forma geral, estão julgando mais umas às outras. Um patrulhamento insano tem se instaurado no nosso meio, promovido por justiceiros que desejam ver “sangue” a qualquer custo.
A polêmica mais recente foi a respeito da abertura ou reabertura dos templos no meio da pandemia. Vi muitas pessoas dizerem que os pastores que defendiam a reabertura eram mercenários e que os que eram contra não tinham fé porque tinham medo do vírus. Primeiramente, essas duas visões se mostram muito superficiais diante da complexidade do tema; mas o que mais assusta é a incapacidade de dialogar e discordar sem precisar atacar e diminuir o outro, sem julgar a posição do outro e quem ele é. Aqueles(as) que fazem uso das redes sociais sabem que esse ambiente é uma terra fértil para se julgar, rotular ou, na linguagem virtual, “cancelar” as pessoas.
Como eu disse anteriormente, Jesus tratou do tema de maneira clara com Seus discípulos: “Não julguem, para que vocês não sejam julgados. […] Por que você repara no cisco que está no olho do seu irmão e não se dá conta da viga que está em seu próprio olho? Como você pode dizer ao seu irmão: ‘Deixe-me tirar o cisco do seu olho’, quando há uma viga no seu? Hipócrita, tire primeiro a viga do seu olho, e então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão” (Mt 7:1 e 3–5).
Quero destacar dois pontos fundamentais desse trecho do Sermão do Monte. Primeiro, Jesus é taxativo ao afirmar “Não julguem”; ou seja, Ele não dá nenhuma possibilidade ou autoridade aos discípulos, e tampouco a nós, para julgar. Não há um contexto ou uma situação que se configure como uma exceção em que nos seja delegada a tarefa de julgar. Portanto, não temos procuração de Deus para rotular ou fazer juízo sobre ninguém ou sobre nenhum comportamento. Sim, devemos e podemos ter um senso crítico a respeito das atitudes e das opiniões das pessoas, e isso com base na Palavra de Deus, mas nossa opinião, ainda que formada de acordo com os princípios bíblicos, não nos confere o poder de sentenciar quem pensa diferente de nós.
O segundo destaque: Jesus diz que, em vez de reparar no cisco no olho do nosso irmão, devemos atentar para a viga ou a trave no nosso próprio olho. Eis aqui uma grande lição. Quando ficamos mais preocupados com a vida alheia, somos capazes de reparar em algo mínimo como um cisco, mas não enxergamos a enormidade de uma trave no nosso próprio olho. Essa figura de linguagem é fantástica. Ao nos apegarmos a algo tão pequeno na vida do outro, deixamos de admitir e resolver questões muito maiores e problemáticas em nossa própria vida. Em português bem claro – ou, no caso de Jesus, em aramaico bem claro –, o que Ele quis dizer é: “Cuide da sua vida”.
O mais interessante desse texto é que Jesus está dizendo tudo isso para o povo da igreja. Observe que Ele diz para os “irmãos” não ficarem reparando um na vida do outro, ou seja, o julgamento acontecia dentro da comunidade fé. Que coisa mais triste é vermos nas redes sociais “irmãos” e “irmãs” se digladiando, rotulando-se, julgando-se uns aos outros. Muitas vezes, na mesma página do perfil virtual, encontramos louvores, versículos, palavrões, xingamentos, defesa de ideologias em detrimento de verdades bíblicas e por aí vai. Sim, Jesus tinha razão. Essa é uma tremenda hipocrisia.
Que o Senhor da seara, que é o único autorizado a separar o joio do trigo, tenha misericórdia de nossas mentes, bocas e dedos.
Do amigo e pastor,
Tiago Valentin