Não existe nada mais preciso na doutrina cristã do que a graça, pois ela é o princípio de toda a nossa relação com Deus. Pela graça, Ele escolheu relacionar-se conosco e nos amar com amor eterno. Pela graça, fomos criados livres para fazermos inclusive a escolha entre amar nosso Criador ou não. Pela graça, o Pai enviou o Filho para nos salvar gratuitamente. A graça é o fundamento da nossa fé, e nós metodistas levamos isso muito a sério e damos grande ênfase para aquilo que chamamos de “Doutrina da Graça”.
John Wesley, fundador do movimento metodista, organizou de maneira didática e pedagógica a Doutrina da Graça. Para ensinar sobre esse fundamento da nossa fé, ele dizia que o primeiro contato que temos com a graça de Deus é aquilo que ele chamou de “graça preveniente”, ou seja, é o amor de Deus manifesto a cada um de nós antes mesmo de tomarmos consciência de quem Ele é e o que fez por nós. Deus escolheu nos amar previamente, antes de tudo; portanto, mesmo antes de nascer já fomos contemplados pela graça.
À medida que tomamos ciência da obra redentora de Cristo e da nossa condição pecaminosa, somos justificados, perdoados e salvos pelo sangue do Cordeiro, mediante nosso arrependimento. A esse processo de conversão Wesley deu o nome de “graça justificadora”. Essa seria a dimensão da graça que entraria em ação nesse estágio.
Somos amados de antemão, somos salvos sem mérito. Tudo isso é pura graça! Mas não para por aqui. Segundo Wesley, uma vez justificados, somos naturalmente levados a experimentar a “graça santificadora”. Na teologia wesleyana, uma vez que somos salvos, Deus passa a nos tratar, ou, nas palavras de Wesley, a nos aperfeiçoar. Esse processo de santificação é contínuo e progressivo. Santidade é fruto da graça de Deus, pois é Ele mesmo quem nos santifica. Cabe a nós desejarmos e buscarmos essa mudança, que é promovida pelo próprio Senhor.
Muitas pessoas vivem as duas primeiras dimensões da graça, mas, quando se trata de santidade, de mudança de vida, observo que muitos emperram. Recentemente, uma pessoa me relatou um episódio de insubmissão e arrogância ocorrido em sua adolescência. Fiquei bastante alarmado, pois hoje, passados muitos anos da sua adolescência, essa pessoa continua dando sinais de insubmissão e de arrogância. Triste constatação!
Anular a graça santificadora é o mesmo que anular a graça por completo. Deus quer amar-nos, salvar-nos, mas também nos santificar. Se não há frutos de arrependimento em nossa vida, não há relacionamento com Deus. À medida que nos relacionamos com Ele, Seu poder e graça aparam arestas, moldam nosso caráter e, literalmente, nos melhoram. Vejo indivíduos que se dizem cristãos afirmando que não se arrependem de nada do que fizeram ao longo de suas vidas. Como não se arrepender e ser cristão ao mesmo tempo?
O teólogo alemão Dietrich Bonhoeffer explorou em seus escritos o conceito de “graça barata”, que, simplificadamente, diz respeito às práticas de pessoas e igrejas que relativizam a obra de Cristo ao ignorar o processo de arrependimento genuíno e de santificação. Acontece que, se não houver mudança, não haverá conversão, simplesmente. A graça é gratuita para nós, mas, para Jesus, ela custou Seu sangue, Sua vida. Vamos dar valor àquilo que recebemos de graça, pela graça!
Do amigo e pastor,
Pr. Tiago Valentin