Há certas doenças – que não estão no corpo, mas na mente – que somente aquele médico sensível reconhecerá que não se resolve com remédio. Mas como o paciente por vezes não aceita sair do consultório sem levar consigo alguma receita, é hora, então, do doutor abrir a gaveta e dar-lhe um frasco de comprimidos cujo componente básico é a inofensiva farinha de trigo, ou seja, um placebo.
Placebo vem do latim “placére” e significa “ser do agrado, prazeroso”. Placebos dão alívio momentâneo, ajudam a “enganar” a dor e fazem a pessoa imaginar que está tudo bem.
Entretanto, há doenças instaladas no homem que carecem de um corretivo total e completo, e somente o Evangelho tem esse poder. Entretanto, esse remédio pode parecer por demais amargoso, e então, para amenizar os sintomas do mal-estar da alma, as pessoas recorrem ao placebo-compras, placebo-noitadas, bebidas, drogas… que parecem fazer bem enquanto seus efeitos perduram.
Concordo que até mesmo a religião pode ser um placebo. E de fato é, quando ela pretende anestesiar a consciência e retirar a pessoa da luta da vida, alterando o seu emocional nos instantes de culto, sem, entretanto dar-lhe respostas que toquem a essência de seu ser. Foi o que Karl Marx observou quando disse que a “religião é o ópio do povo”. Não é justamente isso que acontece quando tantos se alienam numa religiosidade, que ao invés de libertar, engana e escraviza? Quantos fazem da religião um lugar para verem atendidos seus objetos de desejo? Outros, por conta de suas crenças, se retiram do mundo e já não se consideram responsáveis por mais nada nesta Terra. Para estes, religião é narcótico, é um opiáceo.
Mas isso não é o Evangelho de Cristo, que atinge o homem em suas estruturas e em suas entranhas de forma cabal, nem a bíblia é um placebo metafísico, nem igreja é lugar para se refugiar uma vez por semana e receber ali uma dose forte na veia para agüentar os outros seis dias. Evangelho não tira a pessoa do mundo, não doura a pílula, não esconde ninguém numa caverna. Evangelho não é sessão espírita, não é busca de êxtases, nem conversa com anjos. Fé cristã não é rebaixamento da consciência, mas é libertação da mente e do espírito de todas as suas amarras, preconceitos e de todo conformismo. Quando os apóstolos chegaram a Tessalônica, disseram deles: “estes que têm transtornado o mundo chegaram também aqui” (Atos 17.6).
Vivemos uma época de “teologia da caixinha de promessas”, onde não se lê a Palavra, não se busca vida nela, mas se toma uma drágea de versículo-placebo para passar o dia feliz. Multidões vão ao delírio quando pastores gritam do púlpito uma série de chavões-placebo. Afinal, é isso que querem ouvir.
Estamos no mundo não para concordarmos com ele ou conformarmo-nos, mas para dizer que não aceitamos seus princípios, não engolimos suas mentiras, não cedemos aos seus encantos. Por isso que seguir a Cristo não é para pusilânimes, nem para quem busca conforto.
Nossa postura não é de quem está à vontade neste mundo. Na verdade, o cristão bíblico está mais para perplexo e não-conformado. Se considerarmos que tudo o que aí está expressa a vontade de Deus, então eu deveria apoiar e não lutar contra.
Por mais confortadores que sejam os placebos espirituais, não é possível viver de forma madura somente se alimentando deles. Jesus Cristo é o choque de realidade que todos precisam levar. Não é com um evangelho água-com-açúcar que vamos chegar a algum lugar.
Igreja é mero placebo para quem freqüenta como distração, para quem toca seu instrumento sem coração, para quem ora sem paixão e para quem Deus é só mais um objeto num panteão. Cuidado com os placebos!
Pr. Daniel Rocha