Muitas vezes nos deparamos com um dilema: fazer o que queremos ou o que devemos? Eis uma questão muito em evidência nos dias de hoje. Um dos imperativos da sociedade de consumo e pós-moderna em que vivemos é o de que “o importante é ser feliz, custe o que custar”. Em outras palavras, as pessoas devem buscar sua felicidade, quase sempre associada à satisfação de um desejo e, portanto, diretamente ligada àquilo que “eu quero fazer”. Acontece que nem sempre o que queremos fazer é o melhor para nós próprios e para os que convivem conosco, mas, como a “ordem” é ser feliz, passamos por cima de valores, respeito, laços e qualquer coisa que esteja no caminho para alcançar a tão desejada felicidade.
No mundo em que vivemos, satisfazer uma vontade ou um desejo é, de fato, o mais importante. Contudo, ao pensarmos na nossa vida a partir dos valores cristãos, precisamos fazer algumas reflexões. “Tudo” à nossa volta nos diz que podemos e devemos fazer aquilo que nos satisfaz, mas, quando verificamos a proposta de Jesus para Seus discípulos, encontramos alguns questionamentos fundamentais.
Um dos exemplos disso é a discussão promovida pelo pedido que a mãe de Tiago e João fez a Jesus. Ela queria que seus filhos fossem felizes e, no entendimento dela, quem estivesse próximo do poder (do rei) teria privilégios, vantagens, satisfação. Na mesma hora, os outros discípulos, que não tinham a mamãe por perto, questionaram Jesus sobre esse pedido. A resposta d’Ele foi direta e assertiva: “Quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem quiser ser o primeiro entre vós será vosso servo; tal como o Filho do Homem, que não veio para ser servido, mas para servir (…)” (Mt 20:26–28). Na lógica de Jesus, quem é privilegiado, quem é feliz, quem alcança satisfação é aquele que renuncia ao poder, ao status, à própria vontade, e escolhe servir.
Jesus, como sempre, é coerente com Suas convicções. Entretanto, embora tenha dado essa resposta a Seus discípulos, Ele mesmo foi confrontado entre o “querer” e o “dever”. Horas antes de ser crucificado, teve de escolher entre fazer o que queria e o que devia. Sua vontade humana era que aquele cálice fosse afastado do seu caminho, alternativa que certamente iria satisfazer Sua vontade. Contudo, nem sempre a nossa satisfação coincide com a vontade de Deus. Sim, às vezes o que desejamos fazer é o contrário do que Deus quer que façamos.
Jesus escolheu fazer a vontade de Deus; escolheu fazer o que devia fazer, e não o que queria. “Pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz.” (Fp 2:6–8)
Algumas pessoas ficam indignadas ao ter de fazer algo para Deus que não as satisfaz. Penso que precisam olhar mais para Jesus, pois fico me perguntando: qual foi Sua satisfação em ser humilhado, torturado e crucificado? Nenhuma. Mas Ele abriu mão de Sua satisfação pessoal para obedecer à vontade de Deus, pois sabia que devia ir para a cruz a fim de completar a obra que o Pai estava realizando, ainda que isso não lhe trouxesse satisfação alguma.
Certamente, em muitos momentos nossa satisfação pessoal vai coincidir com a vontade de Deus, mas às vezes elas serão opostas. No entanto, quem escolhe tomar a forma de servo, abrindo mão de sua satisfação, escolhe um caminho de honra e vitória. Ao terceiro dia de Sua morte, Jesus foi honrado pelo Pai e, ao ressuscitar, não encontrou uma felicidade apenas momentânea e pontual, mas eterna e abundante!
Na luta entre o querer e dever,
Pr. Tiago Valentin