Os verdadeiros frutos do arrependimento

Os verdadeiros frutos do arrependimento

João dizia às mul­ti­dões que saíam para ser bati­za­das: ‘Raça de víbo­ras! Quem deu a enten­der que vocês podem fugir da ira vin­dou­ra? Pro­du­zam fru­tos dig­nos de arre­pen­di­men­to! E não come­cem a dizer uns aos outros: ‘Temos por pai Abraão’, por­que eu afir­mo a vocês que Deus pode fazer com que des­tas pedras sur­jam filhos a Abraão. E tam­bém o macha­do já está pos­to à raiz das árvo­res. Por­tan­to, toda árvo­re que não pro­duz bom fru­to é cor­ta­da e lan­ça­da ao fogo’” (Lucas 3:7–9).

João Batis­ta” (deta­lhe), por Donald Jack­son (2002)

O tex­to do Evan­ge­lho nos retra­ta uma fala dura por par­te de João Batis­ta às pes­so­as que bus­ca­vam o seu batis­mo. Mas há uma rea­li­da­de naque­le con­tex­to que dei­xa­mos de obser­var ape­nas com uma inter­pre­ta­ção lite­ral da nar­ra­ti­va bíbli­ca. O Batis­mo naque­le con­tex­to sig­ni­fi­ca­va ser iden­ti­fi­ca­do. E, con­for­me João Batis­ta pre­ga­va, o povo que se iden­ti­fi­ca­va com aque­la men­sa­gem era bati­za­do como um sinal exter­no de seu arre­pen­di­men­to inte­ri­or e de sua mudan­ça de men­ta­li­da­de. Seria uma espé­cie de mar­ca, como se um pano cru fos­se tin­gi­do de deter­mi­na­da cor ao ser mer­gu­lha­do num reci­pi­en­te com corante.

As mul­ti­dões che­ga­vam até João Batis­ta à pro­cu­ra do batis­mo ape­nas por­que pare­cia ter vira­do moda à épo­ca. É por isso que João esbra­ve­ja con­tra aque­las pes­so­as, cha­man­do-as de ser­pen­tes, ou víbo­ras. E a per­gun­ta enfá­ti­ca dele a tais “ser­pen­tes” se dava jus­ta­men­te pela ausên­cia de arre­pen­di­men­to. De que adi­an­ta­ria tais “ser­pen­tes” se arras­ta­rem até o rio à pro­cu­ra de rece­ber a água do batis­mo sobre a pele, se no seu inte­ri­or não havia nenhu­ma mudan­ça, con­ti­nu­a­vam em sua natu­re­za peço­nhen­ta? Era a vida delas que deve­ria ser muda­da, e não a sua pele. Com­pa­re-se aqui a ausên­cia do ver­da­dei­ro arre­pen­di­men­to a uma sim­ples subs­ti­tui­ção super­fi­ci­al de esca­mas que as cobras e ser­pen­tes fazem de for­ma rotineira.

João cha­ma as pes­so­as a bus­car um real arre­pen­di­men­to de sua men­ta­li­da­de e de suas prá­ti­cas, exor­tan­do-as a não se ape­ga­rem a uma reli­gi­o­si­da­de super­fi­ci­al no exer­cí­cio da fé. E por isso afir­ma que até as pedras pode­ri­am ser des­cen­den­tes de Abraão e fazer mais do mes­mo, res­sal­tan­do que, para Deus, o que real­men­te con­ta é uma mudan­ça de vida e aqui­lo que se pra­ti­ca como fru­tos ver­da­dei­ros des­sa mudança.

Pen­san­do em nos­sa rea­li­da­de hoje, vemos no Bra­sil um núme­ro cres­cen­te de evan­gé­li­cos a cada ano. Uma pes­qui­sa rea­li­za­da em 2020 pelo Ins­ti­tu­to Data­Fo­lha apon­ta que os evan­gé­li­cos repre­sen­ta­ri­am 31% da popu­la­ção bra­si­lei­ra (mais de 65 milhões de pes­so­as), e uma pro­je­ção da Uni­ver­si­da­de Fede­ral de Minas Gerais (UFMG) pre­vê que em 2036 os evan­gé­li­cos che­ga­rão a 40,3 % da popu­la­ção, ultra­pas­san­do os cató­li­cos, que cai­rão para 39,4%. Isto é, em 2036 qua­se 80% da popu­la­ção pro­fes­sa­rá a fé cris­tã no Bra­sil. Mas, se a taxa de evan­gé­li­cos, que no iní­cio dos anos 1990 era de ape­nas 9% da popu­la­ção, cres­ce expo­nen­ci­al­men­te, por que a rea­li­da­de econô­mi­ca e finan­cei­ra do nos­so país não muda? Por que os núme­ros da vio­lên­cia, das desi­gual­da­des soci­ais, da pobre­za e da fome têm aumen­ta­do? E por que essas rea­li­da­des não são dras­ti­ca­men­te transformadas?

Será que a moda do batis­mo da épo­ca de João Batis­ta che­gou ao Bra­sil nos últi­mos anos? Quem sabe as igre­jas bra­si­lei­ras têm se pron­ti­fi­ca­do a ser pas­sa­re­las des­sa ten­dên­cia evan­gé­li­ca, ou até mes­mo usa­do suas pre­ga­ções e men­sa­gens para fomen­tar a super­fi­ci­a­li­da­de e o indi­vi­du­a­lis­mo em uma prá­ti­ca “cris­tã” vazia, rasa e des­com­pro­me­ti­da com pró­xi­mo? Só assim para com­pre­en­der­mos esse movi­men­to evan­gé­li­co de tro­ca de esca­mas, em que os “con­ver­ti­dos” se impor­tam ape­nas com a sua pró­pria rea­li­da­de e neces­si­da­de, e não em apre­sen­tar fru­tos dig­nos de sua con­ver­são para con­tem­plar a rea­li­da­de de seu entorno.

No tex­to, a mul­ti­dão, os publi­ca­nos e até sol­da­dos são toca­dos pela fala dura de João e inda­gam o que deve­ri­am fazer. João Batis­ta enfa­ti­za a prá­ti­ca da par­ti­lha e da soli­da­ri­e­da­de — “Quem tiver duas túni­cas repar­ta com quem não tem, e quem tiver comi­da faça o mes­mo” —, da hones­ti­da­de e da jus­ti­ça — “Não cobrem mais do que o esti­pu­la­do” —, e refor­ça a neces­si­da­de de uma con­du­ta éti­ca, do zelo pela ver­da­de e do sen­ti­men­to da gra­ti­dão — “Não pra­ti­quem extor­são, não façam denún­ci­as fal­sas e con­ten­tem-se com o salá­rio que vocês recebem”.

Irmãos e irmãs, nes­te Ter­cei­ro Domin­go do Adven­to, em que nos­so anuá­rio litúr­gi­co pro­põe o tema do tes­te­mu­nho, refli­ta­mos sobre nos­sa con­ver­são e nos­sa con­du­ta enquan­to Igre­ja de Cris­to e Igre­ja Meto­dis­ta na soci­e­da­de bra­si­lei­ra, para que pos­sa­mos, à luz da Pala­vra de Deus, apre­sen­tar em cada uma de nos­sas ações, pes­so­ais e cole­ti­vas, os fru­tos do nos­so arre­pen­di­men­to e do nos­so ver­da­dei­ro encon­tro com Jesus Cris­to, para assim trans­for­mar a nos­sa nação, par­ti­cu­lar­men­te a igre­ja, e espa­lhar a san­ti­da­de bíbli­ca sobre toda a Terra.

Deus nos aben­çoe e nos for­ta­le­ça para Sua missão!

Semi­na­ris­ta Pau­lo Rober­to Lopes de Almei­da Junior

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