“O que confia no seu próprio coração é insensato” (Pv 28:26a)
Ah, o coração! Quantos enganos ele já cometeu, a quantas empreitadas que jamais deviam ser iniciadas ele nos remeteu, a quantas convicções frustradas ele já nos levou! Ele insiste em apontar o caminho, como se somente ele soubesse o que é bom para nós.
Ah, o coração! Ele quer a primazia das decisões e, forte como é, nos convence pela sua teimosia. Sim, ele tem lá seus motivos, como Pascal resumiu tão bem ao afirmar que “o coração tem razões que a própria razão desconhece”. Mas uma coisa é certa: a Bíblia diz que ele não é totalmente confiável. Pra dizer a verdade, ele é muito questionável. Confiar somente no que diz o coração e ser guiado pelos seus sentimentos pode nos levar a situações nas quais mais tarde perceberemos que fomos induzidos ao erro por nós mesmos.
Talvez não haja nada neste mundo que fale mais profundamente a nós que o nosso coração. Mas decidir só por ele nos torna seres volúveis e instáveis. Avaliamos mal a situação e às vezes distorcemos a realidade para não enxergarmos o que Deus deseja mostrar. Quantas decisões tomamos sem a devida análise, julgamento, ponderação, meditação e oração!
Nem tudo que está no seu coração é bom; nem tudo que nasce ali é agradável a Deus. Até mesmo o rei Davi, que tinha um coração aprovado por Deus, um dia olhou o conforto de seu palácio, a prosperidade do seu reino, e desejou construir um templo para Deus. Que desejo maravilhoso esse! Quem se oporia? Até o profeta Natã se deixou levar e disse ao rei: “Vai, faze tudo quanto está no teu coração, porque o Senhor é contigo” (2 Sm 7:3). A história nos mostra que o próprio Senhor, a quem o templo seria dedicado, se opôs. Sim, o desejo do coração do rei não era o desejo do coração de Deus.
Não se trata de desprezar o coração ou de anulá-lo, pois se assim fizéssemos nos tornaríamos seres embrutecidos e perderíamos uma parcela significativa da capacidade de vivenciar o mundo com emoção e sentimento. O problema está em não darmos ouvidos também a todos os outros parâmetros que Deus colocou à nossa disposição. Ora, alguém que despreza o bom senso e se recusa a ouvir a razão, é um sério candidato a cometer erros sobre erros em sua vida.
O cristão que usa apenas o coração como base de sua fé estará sujeito a ter uma fé vacilante e extremamente dependente dos sentimentos e, como conseqüência, correrá o risco de cometer enganos, porque se apoiou integralmente na subjetividade de seu coração. Crentes assim podem até mesmo se ver lutando contra o Eterno, que deseja a você uma coisa, enquanto o seu sentimento deseja outra. A fé, então, fica subjugada aos sentimentos, e não à Verdade. “O coração do homem pode fazer planos”, só que “a resposta certa dos lábios vem do Senhor” (Pv 16:1).
Não há nenhum problema em seguir o que diz o coração, depois que a razão, o bom senso, a experiência, a Palavra e os conselhos sábios também se mostraram favoráveis.
Hoje ninguém mais quer ouvir conselhos, mas a Bíblia afirma: “Onde não há conselho fracassam os projetos, mas com os muitos conselheiros há bom êxito” (Pv 15:22). Contudo, que fique claro: devem ser conselhos de quem tem temor ao Senhor.
Já ouvi inúmeras vezes: “Faça o que seu coração mandar”; ou: “Escute a voz do seu coração”. Sim, eu escuto, mas Deus me livre se eu ouvir somente a ele, sem consultar nenhum dos outros parâmetros que o Eterno graciosamente me concedeu. Sabe como a Bíblia chama isso? Insensatez! “O que confia no seu próprio coração é insensato, mas o que anda em sabedoria será salvo” (Pv 28:26). Ou seja, entre o coração e a sabedoria, fique com a sabedoria.
Não há nenhum problema em seguir o que diz o coração quando a paz do Alto nos dá a tranquilidade necessária para tomar decisões. É por isso que o apóstolo Paulo pede que “a paz de Cristo seja o árbitro em nossos corações”. Essa paz nos dá equilíbrio, nos dá serenidade, nos ensina a suportar a adversidade e principalmente, nos remete a uma vida de decisões bem centradas e sábias.
São poucos aqueles que buscam o entendimento que vem do Alto, e muitos cristãos chegam mesmo a desprezar o conhecimento como se ele estivesse em oposição à fé.
Ouvir o coração? Sim, mas não somente.
Por Daniel Rocha, pastor metodista