Inimigo oculto

Tra­ta-se de uma com­pa­nhei­ra de todas horas. Pas­sa o dia ao seu lado, dor­me com você e logo pela manhã já está des­per­ta para mais uma jor­na­da. Jesus man­da cru­ci­fi­cá-la e não lhe dar ouvi­dos, mas pou­cos estão de fato dese­jo­sos dis­so, pois é como rene­gar uma par­te de si mesmo.

Este ini­mi­go ocul­to é a car­ne. Ele se dis­far­ça com ador­nos de humil­da­de, mas sua pre­sen­ça sem­pre se insi­nua em meio a pala­vras dóceis e ges­tos lar­gos. Pela car­ne o cris­tão lou­va, ora, ofer­ta, vai à igre­ja, ama a huma­ni­da­de, reci­ta ver­sí­cu­los bíbli­cos, cons­trói alta­res. Entre­tan­to, quan­do diz que ama, esse amar é sem­pre no geral, e jamais no espe­cí­fi­co, pois é mais fácil dizer que se ama a huma­ni­da­de que amar uma pes­soa. Na ver­da­de, nun­ca amou a nin­guém e é inca­paz de fazê-lo.

É até pos­sí­vel apre­sen­tar vir­tu­des, mas não como fru­to de um cora­ção trans­for­ma­do. Suas vir­tu­des são uma ten­ta­ti­va de pas­sar uma ima­gem que não tem, de mos­trar acer­to. É fru­to do esfor­ço huma­no. Em outras pala­vras, não se enxer­ga, não se vê como cri­a­tu­ra débil e arti­fi­ci­al. E por não se enxer­gar, mos­tra-se per­ple­xo por ser tão pou­co com­pre­en­di­do e aceito.

Um dos gran­des dis­far­ces da alma car­nal é a vir­tu­de que pro­vém da ten­ta­ti­va de auto-afir­ma­ção. É o que eu cha­mo de “car­ne trei­na­da”. Mas é jus­ta­men­te para mos­trar quem de fato ele é e curá-lo que leva Jesus a des­mas­ca­rar a pre­sen­ça da car­ne. Fez isso com os fari­seus que ora­vam na pra­ça, com aque­les que toca­vam trom­be­tas ao dar esmo­las e com o jovem rico cheio de vir­tu­des que fala man­so e cha­ma Jesus de “bom mestre”.

O ser car­nal só tem afei­ção por si mes­mo e o encon­tro com o outro é ape­nas para satis­fa­zer-se egois­ti­ca­men­te. O car­nal não se ale­gra com a ale­gria do outro e, assim como o irmão mais velho do “filho pró­di­go”, recu­sa-se a ban­que­te­ar com quem errou. No fun­do, não admi­te o per­dão ao outro, pois só enten­de a lin­gua­gem do cas­ti­go e puni­ção. A car­ne sofre de um mau-humor crô­ni­co e nada lhe ape­te­ce ou lhe ale­gra de ver­da­de. Por que? Ora, a ale­gria genuí­na é fru­to do Espírito.

O ser car­nal bus­ca sem­pre satis­fa­ção ime­di­a­ta, o pra­zer momen­tâ­neo, daí a difi­cul­da­de de espe­rar em Deus, de onde pro­vém a ver­da­dei­ra ale­gria. Outra carac­te­rís­ti­ca é a fal­ta de pon­de­ra­ção, de meio ter­mo, de bom sen­so. Com ele é oito ou oiten­ta. Para ele ouvir e com­pre­en­der alguém é sinal de fra­que­za e con­des­cen­dên­cia. Per­do­ar lhe é mui­to difí­cil pois a car­ne não se humi­lha a ninguém.

O reco­nhe­ci­men­to da car­ne é o pri­mei­ro pas­so e antí­do­to con­tra ela. Mas se somos cha­ma­dos a viver no Espí­ri­to, a cami­nhar pelo Espí­ri­to, relu­ta­mos, pois isso vai con­tra a nos­sa natu­re­za car­nal. Obe­de­cer a outro não está em nós, que­re­mos seguir nos­sos pró­pri­os dita­mes, que­re­mos cami­nhar pela nos­sa intui­ção, satis­fa­zer aos nos­sos tão aca­len­ta­dos desejos.

Mas não há meio ter­mo: ou cru­ci­fi­ca­mos a car­ne ou a car­ne mata­rá a nos­sa ale­gria, a nos­sa paz, a comu­nhão com Deus e com o pró­xi­mo. Andar pelo Espí­ri­to é um desa­fio que todos os cren­tes pre­ci­sam enfren­tar, pois rene­gar a nos­sa natu­re­za é sem dúvi­da uma expe­ri­ên­cia dolo­ro­sa, mas neces­sá­ria. Nun­ca have­rá matu­ri­da­de espi­ri­tu­al em quem se nega a reco­nhe­cer o poder des­te ini­mi­go ocul­to. Eu, só eu, sou o meu mai­or problema.

Pr. Daniel Rocha

Pr. Dani­el Rocha

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