“Mas tu lhes dirás as minhas palavras, quer ouçam quer deixem de ouvir…” (Ez 2.7).
Creio que todos nós convivemos com pessoas que amamos, mas cuja vida carece de uma compreensão maior de Deus. São pessoas que escondem o desespero existencial atrás de uma fachada de alegria e embalos. Curtem a vida, e normalmente se interessam por religiões orientais, yoga e esoterismo. Dão ouvidos aos seus parceiros de baladas, amam esse mundo pós-moderno e suas maravilhas tecnológicas, gozam sua independência, e negam-se a fazer parte de qualquer coisa que lembre “instituição” – seja religiosa ou familiar. Consideram tudo, menos a Deus. Ao serem questionadas desenham um sorriso maroto nos lábios, como se fôssemos mascates oferecendo um produto que não precisam no momento. Rejeitam de antemão qualquer menção ao Sagrado. É como se dissessem: “Oh Deus, por favor, não precisa se incomodar comigo, está tudo bem”.
Max Gehringer o renomado consultor de assuntos corporativos, pregou uma peça numa de suas falas na rádio. Disse que entrevistara um famoso guru de empresas, o Dr. Reynold Rehm, que respondeu com propriedade e sabedoria várias perguntas suas. Mas ao final de sua crônica, surpreendeu aos ouvintes, dizendo:
“Eu só queria me desculpar pelo fato de que não existe nenhum Reynold Remhn. Eu o inventei. Todas as respostas, embora extremamente atuais foram retiradas de um livro escrito há 2.300 anos: o Eclesiastes, do Velho Testamento. Mas, se eu digo isso logo no começo, muita gente, talvez, nem tivesse interesse em continuar ouvindo”.
O fator Deus está descartado na cabeça da maioria das pessoas. Menos numa situação: diante da possibilidade da morte. Causou impacto a abertura da caixa preta contendo o diálogo dos pilotos da recente tragédia aérea: “Oh, meu Deus…oh, meu Deus” foram suas últimas palavras. Antes do choque fatal, com a situação ainda sob controle, usaram palavras técnicas da aviação, mas diante da inevitabilidade da morte, recorreram Àquele que, possivelmente, nunca fez parte de seus pensamentos cotidianos.
Não é estranho que na hora final ninguém clame pelo seu ídolo, seja Marx, Freud, Raul Seixas, ou Paulo Coelho, mas por Aquele com quem teve má vontade durante toda a vida, Aquele que relutou em buscar e seguir?
Será que Deus é para ser buscando somente quando não se tem mais “cartas na manga”? Quando não há mais nenhuma chance? Será que conversão é só para artista decadente, para jogador em fim de carreira e cantor que vive o seu ocaso? No auge da fama e sucesso, não? No vigor da vida e juventude, não? Fico pensando: será que só diante da tragédia, da morte iminente, da doença incurável é que Deus “serve”? Ele não serve para viver, para amar, para festejar?
Quer dizer, então, que Deus, no fundo, é uma possibilidade real, mas que só se busca no fim? Mas porque muitos não o fazem já? Vergonha, orgulho, medo de rever seus conceitos de vida?
Muitos, pensando nos prós e contras, decidem: “é melhor não”. Dizem isso porque têm medo de dar um salto de fé e abrir mão do lixo que retêm na mão. De que vale o homem ganhar o mundo inteiro e perder sua alma?
Acho que a “culpa” é de Deus, pois Ele não facilita nada, não barganha para ganhar seguidores. O jovem rico saiu contrariado depois de uma conversa com Jesus, que não foi atrás dele melhorando a oferta. Na verdade Jesus desagradou muita gente: despediu os poderosos, decepcionou multidões de seguidores que achavam suas palavras muito duras e fez desfeita na mesa de jantar de pessoas influentes da sociedade.
Mesmo que riam e desdenhem, continue falando e pregando. Somos como João Batista clamando no deserto, e às vezes nos olharão como se comêssemos gafanhoto. Mas há uma ordem divinal que pesa sobre todos nós: “tu lhes dirás as minhas palavras, quer ouçam quer deixem e ouvir, pois são rebeldes” (Ezequiel 2.7). Não temos o direito de desistir.
Pr. Daniel Rocha