“Então, lhe perguntou Nicodemos: Como pode suceder isto? Acudiu Jesus: Tu és mestre em Israel e não compreendes estas coisas?” (Jo 3:9–10).
Certa vez me perguntaram o seguinte: “Você já passou por crises de fé?” E eu respondi: “Quase todos os dias!”. A crise, ou estado de desequilíbrio, quase sempre é vista sob um único prisma, negativo. E, de fato, a crise por si só nunca é algo positivo. Afinal, é um momento ou contexto perigoso, tenso ou de desacordo. A crise pode ter diversas fontes e estar instaurada em variados aspectos da vida. Talvez a mais comentada nos últimos tempos seja a crise econômica, mas também podemos citar a crise política que se iniciou no ano de 1500 no Brasil, a crise judiciária, a crise de valores éticos e morais e tantas outras. Mas a mais fundamental para nós é a crise religiosa, ou de fé.
Boa parte das pessoas, se não todas, fogem de toda possibilidade de desajuste. Estamos o tempo todo evitando as crises, isso quando temos controle sobre a situação. Procuramos fugir dos desajustes, dos desacordos, pois o embate, o confronto, a realidade nem sempre são algo agradável de ser encarado. A bonança, ou o antônimo da crise, é desejada e buscada por todos. Mas pode ser perigosa, na medida em que seja falsa ou aparente, pois pode esconder problemas, descontentamentos ou decepções que são sufocados pelo medo da transparência e do concerto.
Na Bíblia, a crise é sempre vista como uma possível oportunidade de mudança, de melhoria. Há diversos exemplos de homens e mulheres que estavam em crise consigo mesmos ou com o próprio Deus, mas, diante da realidade do pecado, da culpa, do engano, foram levados a buscar mudança de vida ou de comportamento, reação que talvez não seria possível se a aparência fosse favorável. Quando aparentamos estar bem, buscamos convencer os outros, Deus e nós mesmos de que está tudo bem. Queremos a todo custo fingir e esconder nossas dúvidas, fragilidades e crises para não dar lugar à realidade posta e patente de que somos limitados. Tudo o que ultrapassa nossos limites nos leva a uma crise, e ninguém quer ser considerado fraco ou limitado. Assim, lutamos para manter uma aparência sadia. Contudo, nossa alma e nosso coração podem estar profundamente adoecidos.
Assumir a crise e encará-la nos leva a solucioná-la, a curto ou longo prazo, de maneira simples ou complexa. Portanto, a única maneira de resolvermos nossas crises é reconhecermos que estamos passando por elas. Nicodemos muito possivelmente estava enfrentando uma séria crise de fé. Tudo o que ele havia aprendido como fariseu estava sendo desconstruído e relativizado pela pregação e vida de Jesus. Ao se aproximar do Mestre, Nicodemos quer entender e achar respostas para suas dúvidas. E Jesus trava um diálogo marcante com o fariseu, que teve a riquíssima oportunidade de ouvir do próprio Mestre a síntese de Sua Missão: “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3:16).
Ao encarar sua crise e expor suas dúvidas, Nicodemos encontrou uma excelente oportunidade para dar um novo e elevado sentido para sua fé. A crise o levou até Jesus e a ter a oportunidade e de ouvir a Boa Nova do Evangelho. Nós também devemos encarar nossas crises, reconhecer nossas limitações e desajustes e encontrar no Senhor as oportunidades de concerto e amadurecimento.
Do amigo e pastor,
Pr. Tiago Valentin