Uma linda mulher

Abi­gail… esta era sen­sa­ta e for­mo­sa” (1Sm 25.3)

Den­tre as mui­tas his­tó­ri­as de mulhe­res usa­das por Deus para nos ensi­nar, sem dúvi­da há um lugar espe­ci­al para Abi­gail. Ela é retra­ta­da como “sen­sa­ta e for­mo­sa”, mas o seu mari­do, Nabal (em hebrai­co: lou­co, nés­cio), dia­me­tral­men­te opos­to a ela, “era duro e malig­no em todo o seu tra­to… um filho de Beli­al” (1Sm 25.3).

A nar­ra­ti­va de sua saga come­ça quan­do seu mari­do recu­sa for­ne­cer pro­vi­são de ali­men­tos aos famin­tos homens envi­a­dos por Davi, que se encon­tra­va no deser­to, e ain­da lan­çou-lhes impro­pé­ri­os. Ao saber do ocor­ri­do, Davi, toma­do de ira deci­de ir até aque­la fazen­da e matar ao fio da espa­da todos os homens que ali habi­ta­vam. Quan­do Abi­gail sou­be o que seu mari­do fize­ra, car­re­ga um jumen­to com pães, vinho e cere­ais, e vai até Davi, “porém nada dis­se ela a seu mari­do Nabal” (1Sm 25.19)

Sem dúvi­da, Abi­gail era uma lin­da mulher. Porém, bele­za sem sabe­do­ria e bom sen­so é efê­me­ra e vazia. Ela se apres­sa para evi­tar um desas­tre. Ela age, e não se nutre de fal­sas espe­ran­ças que aque­le que deve­ria tomar pro­vi­dên­ci­as para sanar o erro, o fizes­se. Um dos aspec­tos da sabe­do­ria é saber dis­cer­nir quan­do “espe­rar em Deus” e quan­do agir para impe­dir uma tra­gé­dia. Erram os con­se­lhei­ros reli­gi­o­sos quan­do para toda e qual­quer situ­a­ção ado­tam a famo­sa fra­se “espe­ra no Senhor”. Com isso pas­sam a impres­são que nenhu­ma for­ma de ação ou res­pon­sa­bi­li­da­de cabe a nós. Melhor seria acon­se­lhar: “aja quan­do for pre­ci­so agir, e depois des­can­se no Senhor”. E foi assim com Abi­gail – ela sabia que pre­ci­sa­va agir dian­te da imi­nên­cia da situação.

Che­ga um momen­to que alguém da casa pre­ci­sa fazer algo. Aque­le que tiver mais sen­sa­tez, e for mais lúci­do, não impor­ta se é o filho, filha, ou a espo­sa, pre­ci­sa agir.

Con­tra­ri­an­do a mui­tos manu­ais moder­nos de acon­se­lha­men­to, que con­fun­dem sub­mis­são ao mari­do com par­voí­ce da mulher, ela “nada dis­se ao seu mari­do Nabal”. E por quê? Sim­ples – em sua lou­cu­ra ele impe­di­ria qual­quer tipo de ação que con­tra­ri­as­se suas convicções.

Quem é belo sabe reco­nhe­cer-se frá­gil, e não teme mos­trar essa fra­gi­li­da­de escon­den­do-se atrás de uma más­ca­ra de orgu­lho, ou supe­ri­o­ri­da­de. A impres­são que tenho é que habi­ta­mos um mun­do que é um bai­le de más­ca­ras, cada um “ves­tin­do” um ros­to, uma cara, um tre­jei­to. Uns se ves­tem de tris­te­za – mas não a tris­te­za segun­do Deus que pro­duz arre­pen­di­men­to e vida nova – mas a tris­te­za “segun­do o mun­do” que pro­duz mor­te. Outros se ves­tem com a cara de futi­li­da­de, valo­ri­zan­do tudo o que é secun­dá­rio, irre­le­van­te; outros se ves­tem de uma bele­za efê­me­ra e arti­fi­ci­al como bone­cos do museu de cera de Mada­me Tus­saud. Recen­te­men­te, uma pes­soa que per­ten­ce à ala do gla­mour evan­gé­li­co, e que sem­pre osten­tou pesa­da maqui­a­gem, teve sua foto divul­ga­da na mídia onde apa­re­ce com a “cara lim­pa”, sine cera. A dife­ren­ça – fla­gran­te – mos­tra alguém mais huma­no, mais natu­ral. Para mui­tos, o que é impor­tan­te é ficar bem na foto, e por isso a vida se tor­na uma pas­sa­re­la onde des­fi­lam cor­pos – e não pessoas.

A cirur­gia plás­ti­ca pode tor­nar todo mun­do com o mes­mo nariz arre­bi­ta­do, o ros­to sem imper­fei­ções, e uma pele esti­ca­da que aca­ba obri­gan­do a ter sem­pre um inde­fec­tí­vel sor­ri­so no ros­to… Entre­tan­to ela jamais con­se­gue tor­nar alguém belo, pois a bele­za que é fun­da­men­tal vai mui­to além da apa­rên­cia. Na ver­da­de, o belo resi­de na sin­gu­la­ri­da­de que cada um traz em suas “imper­fei­ções”: cer­to estra­bis­mo, uma mecha que insis­te em ficar fora do lugar, a covi­nha do quei­xo, as mãos gran­des, as sar­das no ros­to, a voz rouca…

Quan­do Abi­gail vol­tou para casa, depois de apa­zi­guar a ira de Davi, seu mari­do Nabal esta­va mui­to embri­a­ga­do “e ela não lhe con­tou cou­sa algu­ma, nem pou­co, nem mui­to, até o ao ama­nhe­cer” (1Sm 25.36). Tre­men­da per­cep­ção! Nem sem­pre é hora de falar. Há pes­so­as que não per­ce­bem quan­do pre­ci­sam calar. Não é momen­to, não é hora, não é lugar… e insis­tem em falar; e depois não enten­dem por­que uma sim­ples fra­se trans­for­ma-se numa gran­de dis­cus­são. Não bana­li­ze a pala­vra. Se tiver de falar, fale em amor, fale com sabe­do­ria, uti­li­ze as pala­vras com mode­ra­ção… e prin­ci­pal­men­te veja se aque­le é o momen­to – não estra­gue um pas­seio, uma fes­ta, só por­que você achou no direi­to de falar naque­la ino­por­tu­na ocasião.

O cora­ção de Nabal endu­re­ceu-se tan­to, que pas­sa­dos alguns dias, mor­re apo­plé­ti­co. Esta é a con­seqüên­cia de todo “endu­re­cer-se”. Quem se tor­na empe­der­ni­do e não cede, não revê seus atos, nem sua pos­tu­ra, nem sua vivên­cia “naba­les­ca” (lou­ca), está com seus dias contados.

E quan­to a Abi­gail? Davi, quan­do sou­be da mor­te de Nabal, envi­ou men­sa­gei­ros pedin­do para des­po­sá-la. Real­men­te, ela devia ser uma lin­da mulher…

Pr. Daniel Rocha

Pr. Dani­el Rocha

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