Confissões de um pastor

Devo con­fes­sar que nutro gran­de admi­ra­ção por aque­les que viven­ci­am dia­ri­a­men­te uma comu­nhão bas­tan­te ínti­ma com Deus. Sua ora­ção apai­xo­na­da, a expres­são emo­ci­o­na­da, olhos fecha­dos, uma lágri­ma escor­ren­do pelo ros­to. Sim, admi­ro quem depois de uma hora aos pés do Senhor, enxu­ga a face molha­da, e apre­sen­ta uma expres­são sere­na de quem este­ve acon­che­ga­do nos bra­ços do Pai. Olho para mim, e é só difi­cul­da­de. Como me é difí­cil man­ter a men­te cen­tra­da no céu. Quan­do dese­jo só pen­sar em Deus e esta­be­le­cer um diá­lo­go, peque­nas cenas do dia entram abrup­ta­men­te no cami­nho e elas me afas­tam daque­le que deve­ria ser o cen­tro de minha atenção.

No lou­vor esfor­ço-me para estar dian­te da pre­sen­ça do Rei, de ado­rá-lo em espí­ri­to e em ver­da­de, mas con­fes­so que mui­tas vezes o lou­vor tor­na-se um sim­ples can­tar. Inco­mo­da-me a letra fra­qui­nha, o som estri­den­te da gui­tar­ra, o rit­mo que não gos­to, e depois quan­do ter­mi­na não tenho mui­ta cer­te­za se ver­da­dei­ra­men­te ado­rei ao Senhor.

Ao ouvir os tes­te­mu­nhos de tan­ta gen­te sofri­da, mas que nun­ca per­dem o sor­ri­so e a bon­da­de, faço um pac­to com Deus para não recla­mar mais das intem­pé­ri­es da vida, e nem me sen­tir ansi­o­so dian­te de peque­nos pro­ble­mas. Vin­te e qua­tro horas depois repi­to os mes­mos erros do dia anterior.

Folheio alguns livros de lite­ra­tu­ra cris­tã e todos ali são ven­ce­do­res, não há pro­ble­mas que eles não ven­çam. Ouço líde­res de minis­té­ri­os em evi­dên­cia, e des­cu­bro que Deus lhe deu todas as “dicas” para serem bem-suce­di­dos, e eu aqui no meu gabi­ne­te sen­ta­do à fren­te daque­le irmão às vol­tas com um pro­ble­ma que não vejo solu­ção. E Deus não me “sopra” nenhu­ma res­pos­ta para ali­vi­ar sua dor. Da mes­ma for­ma ouço alguns pro­gra­mas no rádio do car­ro, de pas­to­res curan­do cân­cer, asma, bron­qui­te e a artri­te de seu reba­nho e eu sem pala­vras para dizer àque­le irmão, que sofre dores a meses no hospital.

Embo­ra tenha cons­ci­ên­cia do peso des­sas con­fis­sões nada ale­gres, não me sin­to aban­do­na­do por Deus, nem neces­si­tan­do de uma “nova” unção. Estra­nha­men­te, há uma paz den­tro de mim, há algo me sus­ten­tan­do quan­do meus pés que­rem res­va­lar. Estra­nha­men­te sin­to que, de algu­ma for­ma, em algum lugar, Deus me ama tan­to que mes­mo em meio às mais pro­fun­das decep­ções, e ora­ções apa­ren­te­men­te não aten­di­das, Ele está ali paci­en­te­men­te olhan­do para mim.

Como me ale­gro em saber que o pro­fe­ta Eli­as, era um homem sujei­to às mes­mas fra­que­zas que eu (Tg 5.17). Tenho apren­di­do a obser­var que Deus quer usar o vaso de bar­ro que Ele fez. Deus não pres­cin­de des­sa argi­la tor­ta, mas dese­ja arden­te­men­te que o Seu tesou­ro pre­en­cha jus­ta­men­te esses falí­veis e frá­geis peca­do­res que somos nós. Jesus nun­ca rejei­tou a Pedro por ser intem­pes­ti­vo, explo­si­vo e tem­pe­ra­men­tal. Deus não pro­cu­rou outro pro­fe­ta para colo­car no lugar de Jere­mi­as por­que ele era cla­ra­men­te um depres­si­vo que pedia a mor­te para si. Nem rejei­tou a Eze­qui­el que pare­cia não bater bem da cabe­ça, nem a Jacó por ser men­ti­ro­so con­tu­maz. O fato de mui­tas vezes agir como uma cri­an­ça atra­pa­lha­da, mas que­ren­do acer­tar, me leva a pen­sar que Deus tam­bém olha pra mim com a mes­ma com­pai­xão e cari­nho que olho para o meu filho quan­do age desastradamente.

Decep­ci­o­na­do com Deus por­que ele não me ouviu? João Batis­ta teria mui­to mais moti­vos, joga­do numa mas­mor­ra e depois mor­to, por sua fide­li­da­de a Deus. É ver­da­de, que ele, assim como tan­tas vezes eu, pode ter se sen­ti­do em dúvi­da, aban­do­na­do, sozi­nho. Ele tam­bém era um vaso de bar­ro. E Jesus não lhe recri­mi­na por isso, mas diz dele: “nun­ca hou­ve homem como este”. Pre­ci­sa­mos parar de achar que só os “vito­ri­o­sos” é de quem Deus se agra­da. Essa é uma lógi­ca mun­da­na, que aden­trou os átri­os da igre­ja, e dian­te de algu­ma tra­gé­dia ou aci­den­te na vida de um cren­te, logo se ima­gi­na o quão lon­ge ele deve­ria estar de Deus para lhe suce­der tais coisas.

Entris­te­ci­do por­que Deus não res­pon­deu às minhas ora­ções? Meu ego feri­do pela ora­ção não res­pon­di­da, é a por­ta que Deus usa para me falar. Sai­bam que Deus fala mui­to mais atra­vés de um ego feri­do que pelas bên­çãos acumuladas.

Pre­o­cu­pa­do por não sen­tir cons­tan­te­men­te a pre­sen­ça de Deus? Não. Vejo na Bíblia a pro­mes­sa de que Deus esta­ria sem­pre ao meu lado e não a pro­mes­sa de que eu sen­ti­ria “sem­pre” a sua pre­sen­ça. Uma coi­sa é a cer­te­za da Oni­pre­sen­ça divi­na, outra coi­sa é a mani­fes­ta­ção des­ta pre­sen­ça. Quan­to mai­or a fra­gi­li­da­de da fé, mais exi­gen­tes somos para que Ele reve­le Sua pre­sen­ça. Quan­to mais sei da fide­li­da­de de Deus menos ten­ta­do fico a “exi­gir” que Ele se mani­fes­te. Percebeu?

Se você tam­bém tem mui­to a con­fes­sar de suas fra­que­zas, de seus erros, de suas der­ro­tas, de suas difi­cul­da­des em orar e ado­rar, não hesi­te. Con­fes­se-as ao Senhor. Ele quer ouvi-lo. E sos­se­gue o seu coração.

Pr. Daniel Rocha

Pr. Dani­el Rocha

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